O Diário Económico de 28 de fevereiro de 2013 noticiou que o
“Governo quer aumentar a idade em que os profissionais da PSP e GNR podem
passar à reserva ou pré-aposentação, elevando dos 55 para 57 ou 58 anos.
Objectivo: reduzir entradas de novos polícias.”
O Diário Económico que se tem demonstrado muito claramente, um órgão de
comunicação do partido do Governo, recorre a uma “fonte governamental” não
identificada (as fontes oficiais não identificadas são a origem da maioria das
notícias em Portugal) para anunciar a inclusão dos elementos das forças de
segurança no mesmo balde da tropa e para insistir numa solução pro-militar para
a segurança interna.
A tal fonte governamental oficial desconhecida terá revelado ao Diário
Económico que está em estudo uma reestruturação operacional que passará pela
existência de um sistema de segurança dual com uma única polícia nacional (PN),
assente numa vertente civil (aglutinando PSP, SEF e PJ) e numa militarizada
(GNR).
De acordo com a mesma notícia (que se diga em abono da verdade, é velha,
mas mesmo muito velha... mas continua a aparecer), “A PN deverá ter três
grandes direcções: a segurança pública nos maiores centros urbanos, a
investigação criminal e os estrangeiros. Do outro lado, a GNR, vocacionada para
a vigilância do território, protecção de grandes infraestruturas, controlo de
explosivos e defesa de todos os pontos sensíveis.”
E continua referindo que “Uma das duplicações que o Governo pretende também
eliminar passa pelo Grupo de Operações Especiais (GOE) da PSP e pelo Grupo de
Intervenção e Operações Especiais (GIOE) da GNR. Tendo em conta a natureza
militar destes operacionais, o GOE deveria ser integrado na GNR.”
Ora, vamos por partes tentar explicar (novamente) o que está em causa em
relação ao suposto sistema dual que, sem racionalidade, se pretende manter.
O problema da segurança interna e das polícias não está nas estruturas
policiais civis, porque essas têm entre si competências bem definidas.
Onde existe sobreposições (normalmente no plano da investigação criminal),
tem havido uma crescente ligação, troca de informações e cooperação.
O problema está no que se duplica ao insistir manter-se uma força de
segurança militar que se diz de “charneira” para justificar a sua intromissão
em todas as competências de outros órgãos.
A notícia refere que a GNR está “vocacionada para a vigilância do território,
protecção de grandes infraestruturas, controlo de explosivos e defesa de todos
os pontos sensíveis.”
Admitindo-se que a GNR esteja mais vocacionada que qualquer outro organismo
para a segurança de coisas e não de pessoas, e logo, para a vigilância do
território e de infraestruturas, confesso que desconheço de onde veio a
convicção de que deveria ser seu o controlo dos explosivos.
Acontece que a PSP está envolvida no controlo de explosivos desde que este
começou a ser feito em Portugal. Para não recuar mais, a fiscalização nesta
matéria compete em exclusivo à PSP desde os anos 70 do séc. XX e o licenciamento,
controlo, fiscalização do fabrico, armazenamento, comercialização, uso e
transporte de substâncias explosivas e equiparadas que não pertençam ou se
destinem às Forças Armadas e demais forças e serviços de segurança são da exclusiva
competência da PSP desde 1984.
Surge agora a ideia peregrina que os explosivos são uma coisa que estaria
melhor nas mãos da GNR, pasme-se, com o brilhante argumento de que estes são
militares.
E depois?
Ser militar é uma garantia de mais elevada sapiência e competência? Não é
isso que demonstra a realidade.
A coisa explode, logo deve de ser militar? Haverá argumento mais infantil e
desconexo que este?
Mexer no que está bem costuma dar problemas e, no caso, vai dar certamente
porque não parecem estar a ser feitas contas aos custos do processo de mudança
e à quebra das receitas do Estado nesta matéria que são, garantidamente, de
muitos milhões.
Depois refere-se ainda a uma velha “pedra no sapato” (ou melhor, bota) da
GNR que é o GOE.
Refere erradamente a notícia “Tendo em conta a natureza militar destes
operacionais, o GOE deveria ser integrado na GNR.”
Pois acontece que o GOE não tem natureza militar e existe uma confusão
grande nos pequenos cérebros dos militares e dos seus muchachos (os
Severianos Teixeiras, Bacelares Gouveias, Angelos Correias e Foutouras deste
Portugal), habituados a reduzir as realidades a uma dimensão suficientemente
pequena para que a consigam compreender.
O GOE existe legalmente desde 1982, sendo a primeira e até há pouco tempo a
única unidade de intervenção tática policial para acorrer cenários de alta
violência, quer na resolução de incidentes tático-policiais (não
tático-militares), quer em suporte de quaisquer forças e serviços de segurança
que o necessitem para a execução das suas operações, sempre que se anteveja a
possibilidade de resposta violenta.
À semelhança de muitas outras unidades do género pelo mundo, o GOE (hoje
em dia uma subunidade da Unidade Especial de Polícia) é e deve manter-se civil
e no seio da PSP pois essa é a única garantia de que continua a ser uma
ferramenta de suporte à restante atividade operacional, que compreende e
obedece à doutrina subjacente ao uso mínimo da força (que é apanágio das
polícias e não das forças militares) e que o seu emprego ocorre dentro da
desejável unidade de comando, em complemento da restante atividade policial e
compreendendo o seu alcance e limites.
Se existe nesta matéria sobreposição, essa sobreposição foi criada, mais
uma vez, pela Guarda Nacional Republicana que, com o beneplácito dos políticos,
com despesas e custos desconhecidos, estando impregnada de uma incomensurável
tendência predatória e achando que armas e tiros é coisa exclusiva de militar e
não de polícia, não só criou a sua própria unidade de intervenção copiando a
PSP, como agora está apostada em eliminar essa ferramenta da Polícia de
Segurança Pública.
Em todo o caso que argumentos são estes?
Se armas, explosivos e intervenções táticas armadas são coisa de militar e
devem estar na GNR, isso significa que coisas como trânsito, policiamento de
prevenção e ordem pública, investigação criminal, polícia fiscal e aduaneira,
ambiente e outras competências que não parecem ter as mesmas características
vão deixar de estar na GNR para passarem a estar na PSP ou noutro lado
qualquer?
Este argumento do Militar Versus Polícia Civil vai ser mantido em tais
circunstâncias ou vai mudar subitamente quando for hora de “dar por troca”?
Por fim… acaso saberão os leitores que, ao contrário da GNR, a PSP tem uma
vasta doutrina sobre o uso de armas, um treino eficaz com base em princípios de
necessidade, proporcionalidade e adequação que tem tido como resultado uma
redução substancial dos acidentes e do uso indevido de armas de fogo?
Até que pondo estamos dispostos a aturar estas patranhices para criar e
manter vagas para coronéis e generais?
Quem quiser saber de outros episódios desta triste novela, ponha o cursor
sobre a sigla GOE que está na nuvem de etiquetas e instrua-se.
PM