Nunca te esqueças de quem és!
Olha-te ao espelho todos os dias e reconhece na tua cara a justiça, a serenidade e a coragem. Na rua, levanta a cabeça com orgulho. Ainda que mais ninguém saiba, estarás lá para nos proteger a todos e, quando necessário, agirás, sem hesitação.
Nunca te esqueças de quem és porque, no dia seguinte, terás de olhar novamente o espelho e continuar a reconhecer na tua própria cara, a justiça, a serenidade e a coragem.

terça-feira, 5 de fevereiro de 2013

A segurança nacional segundo o FMI

Concordo genericamente com o que refere o MR relativamente no seu post «O Gang do FMI».
Entrámos numa deriva destrutiva das funções do Estado que, já se percebeu, não tem como únicos atores o Governo ou a Troika. Tem também a colaboração dos partidos da oposição que lá vão deixando cair que coisas como a ADSE não fazem sentido. Gostaria de saber que benefícios os deputados e funcionários da Assembleia da República deixaram de ter, desde que demos conta da situação em que os políticos da terceira república nos meteram.
Todavia, a propósito do relatório do FMI, queria chamar a atenção para uma parte que me surpreendeu porque vai ao encontro do que preconizo para a segurança interna e que já aqui expliquei (V. «Sistema dual puro?»). Apesar de desconfiar dos números que aí aparecem, parece-me importante assinalar o que, num rasgo de lucidez que contrasta com a diarreia ultraliberal do restante documento, faz algum sentido.
O relatório, tendo por base os dados estatísticos da Direção-geral da Administração e do Emprego Público (DGAEP), refere na página 21 e 22 que as forças de segurança (aparentemente o FMI mete no mesmo saco militares, militares disfarçados de polícias e polícias – PSP, PJ, SEF) empregam quase 100 000 indivíduos. Destes, 37 000 estão sob a tutela do Ministério da Defesa (desconheço de quem se trata!) e 53 000 estão na tutela do Ministério da Administração Interna (imagino que seja a soma entre a PSP e a GNR). Adicionalmente o relatório contabilizou 1 700 polícias municipais, 1 800 polícias científicos (PJ?) e 4 000 guardas prisionais.
Se foram só estas as contas, existem imprecisões pois, hoje em dia, não se consegue levantar uma pedra sem que de lá salte uma Polícia qualquer. Não percebi se contaram com a ASAE e com o SEF e se a polícia científica engloba apenas os técnicos e peritos do laboratório de polícia científica ou se inclui o pessoal da carreira de investigação da PJ.
Continua o relatório dizendo que estas “forças” representam cerca de 17 % do emprego público e que o rácio de polícias é de 470 por 100 000 habitantes, um dos maiores da Europa.
Quanto a estes rácios seria importante referir que, a ser verdade que Portugal tem agentes policiais a mais (seria necessário perceber como são feitas as comparações?), também é verdade que Portugal é um dos países mais seguros da Europa e pelo menos as suas cidades, estão no ranking das mais seguras do mundo.
Por outro lado, seria importante aprofundar o que fazem as polícias de outros países. Será que se ocupam da execução de todo o tipo de diligências em favor dos tribunais, das autoridades administrativas, das autarquias, etc.? Suspeita-se que este discurso seja um sinal de que o FMI e o Governo pretendem a privatização da segurança. Nota-se que um dos fatores que salta à vista nas estatísticas dos efetivos de segurança dos outros países, é o peso do sector da segurança privada (muito superior ao de Portugal), aquela que não é para todos, mas só para aqueles que a podem pagar.
Curiosamente, desta parte do problema ninguém está a falar.
O relatório conclui que os gastos em segurança pública estão acima da média da União Europeia, essencialmente por causa do número de estruturas e organizações de segurança activas e não por via das remunerações auferidas pelos seus profissionais que, como também já se sabe, são das mais miseráveis da Europa. Os custos indicados pelo FMI são agravados pela relação entre um excessivo número de “agentes” e as regras aplicadas à passagem à reserva e à reforma, com grande impacto no sistema de pensões.
Aqui convém referir que a questão da reserva e da reforma é um problema causado essencialmente pelos benefícios concedidos aos militares das forças armadas e da GNR e não aos polícias, cujas regras para esses efeitos são substancialmente diferentes. Embora a confusão seja grande quer no Governo, quer no FMI, os que causam esta anomalia são pessoas como o general Carlos Chaves e os outros 132 generais obscuros (V. Generais) e o conjunto de militares das Forças Armadas e da GNR que todos os anos vai para a reserva jovens em idade e com grandes bonificações de tempo.
Na GNR, por exemplo, os limites de idade e as regras para a passagem à reserva (artigo 203.º do Estatuto da GNR, Decreto-Lei n.º 297/2009 de 14 de Outubro) até parecem semelhantes às regras de passagem à pré-aposentação na Polícia e no resto da administração pública, mas é preciso ler também os regimes transitórios e as complicadas excepções que vêm escritas no fim do estatuto da GNR (artigos 285.º e 286.º) para perceber que está tudo mais ou menos na mesma e para compreender porque é que muitos militares da GNR que acabaram de ser promovidos em grande número em 2012 e 2013 passaram logo à reserva com os seus novos vencimentos!
A questão dos múltiplos serviços de saúde distintos e autónomos, dos hospitais militares e dos muitos subsistemas de saúde também me parece que tem de ser atendida.
Na verdade, os hospitais militares só se justificaram durante a guerra e no pós-guerra colonial e hoje, não existe razão para a manutenção da sua integração na estrutura militar como joias representativas da exclusividade, distinção e estatuto de superioridade dos militares, quando existem carências na saúde pública que podem e devem merecer a integração num sistema geral destinado a toda a população.
É claro que não é isso que o Governo e a Troika querem. Preferem sempre a privatização.
Por outro lado, não me parece má ideia a fusão de todos os subsistemas de saúde num único sistema comum a todos os funcionários da administração pública, desde que seja para manter e funcionar… a julgar pela recente postura assumida, quer pelo Governo, quer pelo Partido Socialista, tenho dúvidas que seja esse o plano.
Para que se saiba, os funcionários da administração também pagam impostos (provavelmente até são das poucas classes profissionais que pagam mesmo todos os impostos que devem pagar) e ainda descontam para a manutenção desses serviços, por isso, não é verdade que a saúde dos funcionários da administração pública esteja a ser suportada pelos restantes portugueses.
Ora, considerando a necessidade de racionalizar a segurança interna, o relatório critica, e bem, a multiplicidade de estruturas e organizações existentes. Refere-se na página 26, que a redução da despesa passa, de entre uma série de bizarrias inaceitáveis e alguns crimes contra os portugueses que já foram apontados por MR na sua intervenção, por algo elementar, óbvio e muito razoável: Reduzir a fragmentação e a sobreposição dos serviços da administração central do Estado, nomeadamente, as que são causadas pelo excessivo número de organizações policiais.
O relatório, e bem, indica que uma simplificação do sistema levará, não só a uma poupança efetiva na manutenção das estruturas, mas a um ganho substancial de eficiência por causa da redução ou eliminação dos múltiplos departamentos e secretarias existentes, dos métodos de processamento de vencimentos, dos sistemas de saúde, etc.
A estes ganhos de eficiência apontados pelo FMI eu acrescentaria a eliminação de uma grande quantidade de cargos dirigentes, a eliminação de estruturas e sistemas de intermediação e de coordenação, uma unificação doutrinária e de procedimentos, a redução de interlocutores externos, etc.
No fim do relatório, o FMI expressa no apêndice n.º 1 (página 75) um conjunto de experiências europeias na fusão de forças de segurança que apoio genericamente e que vão frontalmente contra as conclusões sobre o Conceito Estratégico de Segurança e Defesa Nacional dos pseudointelectuais membros da mal-formada e mal-informada Comissão Fontoura.
O referido apêndice, que aponta claramente para a tendência de desmilitarização da segurança interna e a extinção das gendarmeries como caminho da racionalização, dando o exemplo da Áustria que extinguiu a sua “tropa policial” em 2005, da Bélgica que o fez na década de 1990, da Grécia em 1984 e do Luxemburgo em 2000.Em todos estes países da Europa, se compreendeu que os sistemas duais (puros) que o Instituto de Defesa Nacional (IDN), o general Chaves e os pseudossábios da Comissão Fontoura tanto se esforçaram por justificar, são claramente mais caros, menos eficazes e menos eficientes, estão sujeitos a maiores entropias e bloqueios por via da excessiva compartimentação de patamares de intervenção, geridos por diferentes organizações e são geradoras de conflitos cuja resolução, invariavelmente, carece da intervenção de uma outra estrutura de coordenação que também tem de ser criada e mantida. Todos esses países têm hoje polícias civis e extinguiram as suas guardas.
O futuro da segurança interna e da justiça em Portugal passa pela alteração profunda e cuidada do nosso sistema (se é que assim se pode chamar a actual rebaldaria!) policial.
Essa alteração tem de implicar a extinção da GNR, corpo estranho de ínfimas particularidades, politizado, enfermo de profunda esquizofrenia, dispendioso e ineficiente, permanentemente predatório e conflituante, na “charneira” de tudo e sem identidade claramente definida para além do seu estatuto militar.
Essa alteração implicará, todavia, em nome da democracia, da justiça e do equilíbrio do sistema, a existência de duas polícias – apenas duas polícias!
Uma Polícia Nacional, civil, integral, com competências de polícia administrativa e de polícia criminal, dotada de todos os recursos operacionais destinados a fazer face ao conjunto de riscos e ameaças que pendem sobre a segurança objectiva e subjectiva dos cidadãos. Aqui, o modelo actualmente implementado pela PSP é claramente o mais eficiente e eficaz.
Uma Polícia Judiciária, civil, altamente especializada, dotada de meios tecnológicos de ponta e de recursos humanos e materiais de excelência que se dedique à investigação de criminalidade altamente complexa e grave, nacional e internacional, das redes de tráficos, das organizações criminosas e terroristas e dos crimes de corrupção que tanto nos afligem e que tanto contribuíram para o actual estado do Estado. O modelo da PJ é bom e pode ser potenciado para ser melhor.
A ligá-las um sistema de informações único partilhado e dividido por patamares e controlado pelas autoridades judiciais.
Este sistema garantiria a supressão das estruturas da GNR, SEF, ASAE, Polícia Marítima e até do gabinete do SG-SSI e do SIS, já para não falar do assessor para a segurança nacional do primeiro-ministro (cargo concorrencial do SG-SSI, criado pelo general Chaves para o general Chaves).É claro que perante este cenário, logo teve de se reunir a toque de clarim os poeirentos defensores do lobby militar do costume.
O diário Expresso de 19 de janeiro foi questionar um conjunto de eminências pardas que, sem argumentos ou fundamentação, se despacharam a justificar porque o Governo não deveria extinguir a GNR e fundi-la na PSP.
Para além de um chorrilho de asneiras assinadas pelos repórteres Hugo Franco e Micael Pereira, certamente apenas culpados de engolirem as mentiras que lhes contaram, existe uma que consideramos ser uma das mais extraordinárias: a de que retirar polícias e militares dos serviços burocráticos poupa dinheiro em suplementos (quando é exatamente o contrário!).

A notícia, que serve apenas para dar uma nota tranquilizadora aos oficiais do exército e a alguns da GNR que essa força não será extinta, apresenta como sábios de serviço Loureiro dos Santos (general na reserva… um dos muitos e muitos… que também foi ministro da defesa), Rui Pereira (ex-ministro de Sócrates que conseguiu aprofundar as diferenças entre a PSP e a GNR e manteve a monstruosidade em pleno crescimento), Mário Morgado (juiz que teria sido o pior diretor nacional da PSP de sempre, não tivesse o Governo ainda nomeado Branquinho Lobo e Orlando Romano, que conseguiram bater a sua bela marca) e Mourato Nunes (general que comandou a GNR, que impediu que os seus subordinados se aposentassem sem gozar férias para não as receber em dinheiro e depois aposentou-se reclamando o pagamento das férias por gozar. Criou uma sala cerimoniosa no comando geral da GNR à qual deu… o seu nome. Foi premiado por Sócrates e Rui Pereira com um cargo criado especialmente para si no Ministério, que se extinguiu com a sua saída e no qual pode continuar a usufruir de um sem número de regalias régias como, por exemplo, ter motorista da GNR). Assim se perdeu a discussão de um dos mais importantes assuntos da segurança interna: a racionalização por via da eliminação de um corpo estranho.
PM